terça-feira, 1 de setembro de 2009

Afropoesíaco

O sorriso mais perto da boca fica aproximadamente a uma ou duas distâncias daqui. Se isto não sai imaculado não é por não compreender a distância mas porque já só consigo escrever à dentada cada verso que ocupa o lugar de um beijo. Já só contigo consigo abrandar batimentos cardíacos que ameaçam a integridade física dos poemas que escrevo em voz baixa para ninguém saber. Bando de cordas vocais em segunda mão usadas para açoitar tímpanos de quem espreme a memória até ao osso. Inventa solidão para preencher isto que não é poema escrito em voz alta não é fracção de noite em que se calam afectos não é nada que entra pelos bolsos e sai pela boca não é coágulo de barro para asfaltar flores que faltam nas tuas mãos mal adivinhadas.

É isto que eu quis. E nunca vos disse por querer tanto ajustar palavras à verdade embora por entre metáforas de fácil indigestão. Ousadias que usam noites para se africarem em danças de alma. Em pegadas em que não deixámos passos. No horóscopo que desacerta a idade que o beijo demora a chegar ao coração. Tempo que o capim demora a crescer e a tapar os rios com lençóis de granito. Distância que a luz demora a entrar pelos teus olhos e a sair pelo que escrevo. Palancas que caminham rente ao arco-íris. Sono indormido que assinala o sonho e a página antes de apagar a leitura. Poetas que mastigam à dentada versos que ocupam o lugar do vazio. Outros que espremem a memória até ao que não posso apregoar com a tua voz. Os mesmos que vendem poemas ao preço de gotas de água só para matar a fome das palavras. Olhos que vi com os meus próprios. Espelho tão teu mas muito mais nosso do que meu. Carícia que me afrodizias com o olhar. Aquietei. Atei tudo num saco e atirei dentro de um rascunho.

Porque nem sempre o corpo é um lugar atraente em que se está. Porque defendo a tua loucura. Dela dependo para continuar a querer. Porque poesia não é ainda poesia se por dentro não tiver pelo menos um centímetro de amor antes de ser solidão. Isto nunca vos disse. Porque isto não é como um poema.