quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Omnipoético
Agarrou o poema com os lábios e pronunciou beijos que nem sequer eram palavras. Endireitou a voz por dentro. Foi buscar fôlego ao fundo dos pulmões para pedir à chuva que tombasse aguamente sobre o chão que lhe fugia das mãos.

Ao regressar. Subiu como os pássaros ao telhado das árvores. Lançou asas pela distância íngreme que vai do sentimento à escrita. Depois. Ajustou o sono ao fuso horário do infinito. Com a ponta dum fósforo construiu diques imaginários contra a insónia e pendurou-a por fios de lume para não se apagar.

Dezembro-me como se fosse hoje. Flocos de lenha derretiam-se na lareira tentando calar o frio. Lá fora os ramos sacudiam o vento perante a dança inquieta das folhas. Assobios pingavam em forma de música como se cada gota pudesse remunerar o coração com sopros mágicos de lume. Em troca de nada.

Leitor. Pergunta-lhe agora mesmo em que parte do corpo a ausência das palavras tem a força de uma multidão? A que distância os gomos de neve se deixam morder pelo sol quando nos faltam garfos para levar o sono à boca? E já agora leitor diz-lhe que o poema não se agarra com os lábios. Que os nossos passos embora dançados de cansaço hão-de sacudir sorrisos em véspera de poesia. Em toda a parte.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Palavras são coágulos de imaginação... Não servem senão para dar resposta ao instante que nos corresponde.

domingo, 7 de novembro de 2010

sábado, 6 de novembro de 2010

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

terça-feira, 2 de novembro de 2010

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Finituridade   
Se há coisa que não desejo a ninguém é descascar as nuvens como se laranjas fossem gomos de chuva descendo pela espinha dor sal do mar.

Isto é só poesia. Eu sei.

Morde na minha boca as palavras que se calam nos teus lábios carmudos. Água-me a sede desse doer tão doce. Sim. Isso mesmo. Molha-me. Traz-me um copo cheio como se tivesses soluços no olhar. Lavra. Cultiva-me. Ser penteia os sentimentos. A respiração e a folha em branco em cima da mesa. Não sei porquê. Acho-te mais poética com o cabelo desarrumado.

Enquanto os braços se renderem aos sonos que trazes colados no rosto.

Apanha as pegadas espalhadas pela casa. Amor. Pega-me ao colo com a força da tua vontade. Não quero amarrotar o chão com os meus passos. Se os caminhos continuarem a passar de que nos vale ter tanta pressa? De que me vale. Amor. Tocar a sílaba tónica por entre os dedos ou manchar lençóis com silêncios em contrabaixo ou chamar pelo teu corpo para me ajudar a desmanchar a cama?

Enquanto escrevo isto.

Contagia-me com as tuas asas. Voa-me todo de uma vez ou cai a pique no poema côncavo que cavo aos poucos. Porque se há coisa que não desejo a ninguém é ter insónias na voz e engolir o timbre dos búzios em dó menor.

Enquanto esta carta tiver a data de ontem. Não coloques vírgulas na alma. Nem na poesia.

Semeia o sol por dentro para bronzeares a epiderme do coração. Semeia-o. Na fundura das nuvens já descascadas. E nas pedras que se tornaram corpo. E nos versos que escrevi baixinho para não te adormecer. E nos semáforos inapagados iludindo a cidade.

Enquanto as memórias recuarem até ao presente.

Deixa cair o voo das palavras e dá poesia aos que deixam folhas em branco por não conseguirem terminar o sentimento.

Por hoje.

Finito-me.
A Poesia seja convosco!

   

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Acabou-se-me a tua ausência. Instante que se prolonga corpo inteiro como um barco-íris à deriva no céu. De agora em diante. Além dos três litros de solidão que guardei na dispensa não sei com que versos completar as noites em que respiro à custa de poemas. Quando estou a sós com as palavras e concretizo futuros para te dispensar em pensamento.
Beija-me ficar aqui sozinho!
Porque um verso basta para emagrecer o grito submerso na tua garganta. Um retrato é suficiente para te aproximar do meu coração nem que seja só por amor.
Mas beija-me ficar!
Prosa não é haver caminhos que surgem para te capturar e desarrumar memórias. Prosa é quando o vento se insurge em nome dos teus passos tombados no chão.
Com que verbo irás apaziguar as pulsações que embatem diariamente contra os pulsos? Que poema gestual irás encenar quando as palavras deixarem de ser só isto? Responde em voz baixa para que os leitores não nos oiçam. As palavras podem estragar a beleza de um poema quando fazemos mau uso do coração.
Véspera por mim!
Chuva-me até à última gota. O bastante para te embebedares com a luz poisada no parapeito desta janela. Mas não te aproximes dos meus pensamentos. A menos que me deixes a tua ausência disponível para quem quiser despejar beijos dentro da minha boca. Algo me diz que já temos idade para riscar na parede versos que faltam para nos arriscarmos a ser poesia. Beija-me ficar. Antes que a vida me peça esclarecimentos acerca do poema onde escondi a tua ausência para te pôr a salvo das minhas ilusões.
Beija-me imediatamente sem aviso prévio!
Dá-me um abraço sem que os meus braços te peçam. Belisca-me o sono e a voz como te ensinei. Busca os retratos que atirámos no lugar da roupa suja como se neles fosse possível lavar o odor do cansaço. Pede-me em amor. O coração pode estragar a beleza de um poema quando fazemos mau uso das palavras. Repito.
Despede-me em ti!
Nenhuma flor chegará às tuas mãos a não ser aquela que inventámos para germinar no entulho dos sonhos.
Desta vez. Garanto-te!
Deixarei o teu vazio à disposição de quem quiser encher as mãos com horas fora do prazo de validade. Não vou mais pendurar minutos em pêndulos preguiçosos ou beijar-te ficar sozinha na sala de espera cruzando palavras usadas. Não vou mais fotografar retalhos como um ser que dói da mente captura memórias por arrumar.
Desta vez. Mesmo sabendo que não se pode ser amado à custa de um poema serei grato à poesia por não nos ter transformado em dois corpos sem uso.

sábado, 4 de setembro de 2010

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O passado é o limite a partir do qual tudo se torna presente. O quê que ele quis dizer com isso?

Sei lá! Não me perguntes a mim. Os loucos têm o hábito de dar sentidos imprevistos à normalidade. Tenho mais que fazer do que aturar a lucidez dos outros!

sábado, 28 de agosto de 2010

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Tantas razões para regressar à escrita. Não encontro o motivo.

sábado, 21 de agosto de 2010

terça-feira, 17 de agosto de 2010

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Praia de Paço de Arcos

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Lagrimático
Disseste das mãos que afinam as cordas vocais do vento. As mesmas que pintam o céu da dor do mar. cor-de-aurora. As mesmas que recuam as noites até ao primeiro dia em que apaguei o timbre mudo do teu olhar
“dancem batuques até as pedras se transformarem em música. Acabem a infância noutra idade do corpo. Sacudam as árvores e o fogo os troncos e a água os ramos e o vento. Vaginem-me descaradamente como se o amor fosse a única solidão que descarrego nos braços. Gostem-se também. Bebam a sede à beira da garganta. O ritmo. A rima. Os rios. Tombem em cima dos meus cansaços. Descalcem o caminho por baixo dos pés. Tentem espremer as nuvens até o céu cair gota a gota. Respirem-me fundo como peixes fora do aguário mas não adormeçam nas escamas da minha pele. É preciso muito mais do que chuva para regar um imbondeiro”.
Respondi: “os dias viajam-se à velocidade da luz em excessos de lentidão”.
Disseste das mãos que cosem rugas à flor da pele. As mesmas que multiplicam o pão de cada dia por um milagre à força. As mesmas que fazem lagrimografias a preto e branco à espera do arco-íris. As mesmas que curam os gritos adoecidos na tua voz
“o infinito é um prazo demasiado pouco para nos escondermos nele. Perdoar-me-ás se este poema adiar por mais tempo a brisa do lado de cá do rosto? Perdoar-me-ás se as ilusões não servirem mais de desculpa para escrever? E se perderes o direito de me perder. Perdoar-me-ás se estas mãos não conseguirem poemaciar a tua pele? Seja qual for a resposta. Confesso. A verdade pesa mais por dentro do que na mão que a escreve. Confesso-vos. Poesiam-se-me horas em que distribuo a minha própria ausência por todos os cantos deste habitáculo. Na gaveta da cómoda. Nos retratos mal tratados. Na toalha de renda bordada por nós. Nos pires. Guardanapos. Chávenas. Prateleiras. Almofadas. Em tudo. Porque mesmo quando te encontro. Dos teus braços apenas recebo o abraço que ainda me deves. Faz o que quiseres com as palavras mas não me dês mais poesia para curar o silêncio. Há sons que nada podem em certos dias”.
Respondi “perdoar-te-ei quando colocares um ponto final na eternidade”.
Disseste das mãos que tentam distrair o mundo para lhe adormecer o peso. As mesmas que pesam no rosto como safanões que não se deixam ver de tão pequenos que são
“calem-me a boca à chave e deixem a porta aberta para a inspiração não fugir. Durmam todos os meus sonos. Hoje estou disposta a passear a noite em branco como esta folha este lençol de água que me dorme em cima estas paredes esferovite estas frases poesientas este vazio intensamente cheio a que por vezes se dá o nome de poesia.
Hoje sinto-me capaz de aparafusar o nome do mar à memória para não lhe perder as sílabas. Jurar nunca mais meter pombos-correio dentro de cartas aladas. Surdar os tímpanos só para não te ouvir de voz em quando. Empanturrar-me com o soro que me dás para alimentar a alma. A bem suar o suor da tua pele obscura. Agrafar os pés às asas que usas para desvoar. Dizer-te mudamente com todas as letras que não sou feita à imagem do espelho em que me lês.
Dizer-te. Por mais tua que eu seja serei sempre minha. Por mais poema que sejas serás sempre um versículo escrito em prosa. Mas. Escuta. Deixa-me perguntar só mais uma coisa. Haverá outro modo de atear fôlego à tua respiração sem ser boca a boca?”.
Respondi “nem todos os dias que nascem com palavras nascem com poesia. Mas a vida surpreende-nos sempre. Nem que seja no fim do poema. Até lá. Tentemos aparafusar as sílabas do mar à memória sem lhe perder a distância. Mesmo que no coração não haja espaço para mais ilusões e nos pulmões não tenhamos fôlego-de-artifício para atear à inspiração dos outros”.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

As metáforas também servem para mascarar a ausência de imaginação porque mesmo inventando não estás a criar nada de novo. Apenas a invencriar o ridículo que existe em palavras arrumadinhas por desordem alfabética.

Cada um escreve com a solidão que tem.
"ParadoXos"
o blog do mês na rúbrica mensal do
Poderão ler a entrevista
aqui

quinta-feira, 22 de julho de 2010

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Exposição fotográfica de Hugo Estrela
"contextos" escritos por mim
Local: Biblioteca Municipal de Cascais

Até 31 de Julho

Entrada: grátis

Horário: ‎2ªs das 14h às 18h 3ª a 6ª das 10h às 18h

sábado das 10h às 14h

Próximo do Shopping Cascais Villa e da estação dos comboios.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

sexta-feira, 2 de julho de 2010

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Agarra-me! As palavras doeram-se. Por agora o poema é o lugar onde adormeço quando não consigo escrever o sono. Agora é inútil engolir versos como se fossem beijos. Em seco. Em delírios que se curam à chapada. Em poesia que poisa em nós quando o mundo não está. Em carícias silvestres que te arranco das mãos para plantar na pele da água. Em poemas que falam quando os homens neles se calam a si próprios.

Por tão pouco.

Envolvo nos braços o abraço com que me agarras. Rastejo rios como se fossem um Tejo à beira dum sentir ausente. Enrolo-me nos dedos por onde masturbo noites como se fizesse amor na véspera do infinito.

Por tão pouco.

Parto a voz em pedaços de música como se os poemas fossem fios de água morna caindo pingando vertendo em gotas de areia. Trinco bolas de sabão de tão querer buscar-te sonhar-te dançar-te desejar-te loucuramente. Tanto. Meus Deus! Tanto.

Por tão pouco.

Existo-me de um lado para o outro. Ponho canções nestes lábios que se entrebeijam em valsa convulsiva. Bebo-lhes o tinto e o fruto. Devoro palavras até atingir a embriaguez. Com alento. Com força. Contudo. A poesia não interessa quando a solidão se entorna maior do que versos dentro da boca.

Por tão pouco.

Quantas cócegas irás sorrir de mim quando a realidade te coagir a devolver as alegrias que a ilusão te emprestou? Não sei. Invento-me como se fosse Outono. Faço folhas cair desengonçadas ao cair do dia. O ar agita-se impetuoso mas é dentro do peito que se faz mais. Mais incompletamente. Mais uma inventania de frases em direcção ao não sentido. Por tão louco sentir que é teatro.

Por agora. As palavras amaram-se. Outros lançam traços de tinta contra as paredes para escrever auto-retratos. Quando muito desenho auto-poemas e ainda não lancei nada. Mas não me queixo de barriga vazia. De poesia estou eu cheio!

Por tão pouco.

Quem me dera desinscrever-te na memória. Saltar o muro dos teus murmúrios de um momento para o outro. Pedir-me em namoro dos pés à cabeça sabendo de antemão que a resposta virá depois do esquecimento. Pedir-te que sejas névoa lume casulo nódoa de espuma que florescéu azul. Cansar-me de rascunhos sobre nós e começar a escrever sobre viver.

Por tão pouco.

Quem me dera alugar os teus olhos para com eles inventar outro espelho. Ser todo imenso. Todo verso de uma ponta à outra. Recém-nascer dum parto qualquer e escapar por ventre aspas e asteriscos. Chegar ao fim desta estrofe. Aninhar-me no colo das metáforas só para ver as palavras sorrir.

Porque na verdade. Elas sorriram-se! O poema é o lugar onde vamos acordar quando um dia conseguirmos escrever o sono.

Errata
Onde se lê agarra-me, deve ler-se h-rra-me.
Onde se lê embriaguez, deve ler-se embriagaguez.
Onde se lê alento, deve ler-se além-tu.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Desaparências
Das noites em que meço a respiração dos pulsos com o lado mais macio dos teus cansaços. Das tardes em que bebo granizo pela boca da chuva e oiço a voz entornar-se gota a gota no chão descalço dos passos andados. É só disto que sei dizer. Mesmo quando quero expoesiar-me dos meus próprios gritos e romper palavras sem mais nem menos. Ir à toa com asas de quem fica. Ir sem caminho e apanhar-me de surpresa antes de ser engolido pelo teu abraço. Descalçar girassóis pétala a pétala até se transformarem em giraluas. Descascar versos gomo a gomo como se fossem sabor de laranja. Ir a sós com beijos insaborosos mostrar que nós também sabemos sorrir. À noitinha. Quando a dor meço com o lado macio dos cansaços.
É disto que sei dizer!
Quando a mansidão se impõe como um ruído sísmico. Só assim consigo escrever. Descascado e sentimentoso. Eis porque me lambuzo com bocadinhos de fome e vou embora de ti para voltar nunca mais ou no penúltimo verso depois do amanhecer. Eis porque apanho balanço para relampagar o céu e faço rascunho antes de pôr sentimento no coração e semeio pétalas onde só existes um pouco só.
Por isso.
Apago. Risco. Volto a dançar com palavras. Arrisco de novo. Assobio cítaras. Enfio sonhos uns atrás dos outros. Desenho um mapa na palma da mão. Desafio-te a usar silêncio para ser poeta ainda que disto não saia nada que sirva para enxugar aquela voz entornada no papel. Desafio-te a pintar os lábios com a cor dos meus beijos. A colocar legendas nos gestos que me queres dizer ou transmentir. A respirar o fôlego de cada frase como se isto fosse de prosa e não um poema.
Desafio-te!
Desafio-te a encontrar de novo um novo caminho que te encontre. Caso contrário. Que farei com a poesia se de tanto te dizer adeus as mãos acabarem aqui? Que farei?! Que farei com este corpo que me resta se não regressares (pelo menos) para te dizer cara a cara que afinal não sou alérgico ao silêncio? Que farei de mim se depois da bonança não sobrar sequer vestígio de alma para te acalmar?
Agora. Pergunta-me como te chamo!
Faz de conta que és metade de ausência e farei de ti meu sono preso por um fio de insónia. Pergunta-me como te chamas. Chamar-te-ei prosa poesíssima! Chão em que me deito. Devagaroso. Entre verdades e fantasiação.
Porque é disto que sei escrever!
É isto que me desaparece da frente quando invento lagrimações só para tornar a solidão mais convincente. É isto que me aparece como se alguma vez tivesse escrito sem sinais de pontuação.
É disto que sei escrever!
Desaparências. Coisas que varrem nos poemas o que neles não deve iludir.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

domingo, 25 de abril de 2010

segunda-feira, 19 de abril de 2010

sábado, 3 de abril de 2010

Poemorfose
Fechou os olhos a cadeado para o sono não fugir. Espalhou o quarto por toda casa à procura de cinco milímetros de infinito para trocar por um poema que não doa e que seja lido e engolido de uma só rajada. Trocou cigarros que nos fumam de boca em boca por frases brevemente acesas na pele áspera das pedras. Trocou esta tosse nas palavras pela pressa que se contorce por não chegar. Tocou palmas e semi-colcheias com mãos de trompete para simular o sopro barulhoso do vento. Trocou o quarto a sala a cozinha a varanda o buraco da fechadura e a casa. Por mim teria deixado tudo como está. Até mesmo a sujidez do cinzeiro. Teria trocado apenas uma ou outra morada de lugar. A começar por ti. Na morada que és onde não me demoro.

Porque ainda é utopia desenhar chuva nas paredes do estômago pintadas de refresco. Ainda é distante mordiscar no teu corpo as sílabas tónicas que bóiam à tona do poema. Namorar em ti como um hóspede que vem um pouco para sempre. Dar-te de comer ilusões fora do prazo de validade para que não te iludas com beijos que faço desembocar na tua boca. Ainda é preguiça acariciar-me com toda força das tuas mãos. Pregar soluços ao susto antes mesmo das emoções terem valor de troca por número de páginas. Antes mesmo de deixares escapar o sono por um bocejo. Antes da maré desaguar onde as ondas rebentam.

Trocarei o mar por um nada dum abraço em bocadinhos de eternidade. Trocarei um corpo ex-feliz por um músculo que sinta por mim o prazer do outro. Trocarei o motor que bate cá dentro pela ilusão que estragas quando atiras versos às pedras como se fossem retalhos à espera do caixote do lixo. E serão. Enquanto não aprender a meter conversa contigo. Enquanto tiver asas a baloiçar na ponta da língua sem que saia estrofe onde palavras possam cair vivas. Enquanto esquecer for emagrecer na memória o que ela não precisa. Enquanto ortografas poemas nas garrafas nas pétalas nas pálpebras e no peito e nos lábios e na língua e em água fria. Aliás. Água quente para não arrefecer o grito em pose de poesia.

Não há pecado em bisbilhotar-te as partes íntimas e gulosas do pensamento. Mesmo correndo o risco de aleijar-me deliciosamente nos teus dentes. Os versos serão só versões que os outros dirão. Portanto. Fala-me tu.

Quanto pesa o silêncio antes dos teus gritos se transformarem em magia? Quem tem borracha para emagrecer a memória de modo a não pesar mais em ti nem em pensamento? Onde esqueceste a casa na qual habitámos os maus hábitos um do outro quando a solidão ainda não era utensílio de uso pessoal? Como pode o coração contrair tantas variações de amor por metro quadrado? Como pode o sol soltar-se se não tiveres já um fósforo à mão?

Pergunta-me tu. Poema. Vestígio de pétala manuscrita. Desejo de esfarrapar a voz contra às claves que se soltam à gargalhada e continuam de pé. Rosnar pedaços de chuva caindo em pó. Uivar baixinho estouros de batuque que tombam acelerados como bofetadas nos tambores. Rugir sussurros chilrear danças malcriadas que se esfregam embatem rolam e rebolam no corpo. Desabotoar o mar ao meio com rimas amarrotadas. Correr como uma bala de açucar até à boca da janela. Lançar-me às palavras com gula. Largar vírgulas em cima deste texto e mandar parar o caminho com semáforos de papel.

Aquietar as asas que bato aqui. Deixar o pensamento cambalear no ar como flores respirando às escondidas os últimos pingos de Primavera. Abrir os braços. Espreguiçosos. Beliscar-te o sono o sabor o cheiro a cor e a pele. Só para ver se és mesmo sonho. Abrandar. Trocar estes cinco milímetros de felicidade por nenhum poema à beira-lágrima. Porque é tão bom. Poesia. Respirar isto. Nem que seja só por um pouco. Para sempre.

terça-feira, 30 de março de 2010

segunda-feira, 22 de março de 2010

BRISA DE PRAIA
disse:
Porque há voos aparentemente cegos que nos encaminham para a luz...

quarta-feira, 17 de março de 2010

Afiar cigarros com os lábios.
Deixar queimar o tempo até ao filtro.
Apenas hoje.
Hoje que ainda não somos memória.
Nem totalmente poema!

quarta-feira, 10 de março de 2010

terça-feira, 2 de março de 2010

segunda-feira, 1 de março de 2010

sábado, 27 de fevereiro de 2010

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

360 graus de Amor
Não quero poesia nos meus poemas sobretudo aquela cuja pele é farrapo e cansaço e gume e pulso e âncora inútil ilusão. Talvez poesia seja só pretexto para arrastarmos as palavras connosco. Sim. Arrastar palavras pelo braço de uma frase e de repente apagar a frase e o braço e largar fonemas a pique de encontro ao coração metáfora. Talvez. Talvez não queira palavra nos meus poemas só por haver silêncios que nos quebram a fala. Talvez não queira poema na minha poesia só porque tenho coisas imaginadas em horas de não ter mais nada que fazer.
Poema não quer ser poesia quando te sentas à porta das palavras à espera que entre um verso e outro verso entrem pela janela frases perfumosas que não saem nem amar-te lada. Talvez o amor não queira ser diminutivo tão rapidinho tão ilusãozinho tão pouquinho até no tamanho. Talvez isto seja só a minha âncora farrapo palha falhaçada inútil amassar de pão que como em dias tão nossos como ninguém.
As árvores e as aves as sombras e o ombro que te encosto à cabeça. São protestos de te dizer em voz doce: Colmeia-me o silêncio pólen de poesia. Pedra-me sete pétalas na mão e atira-me o primeiro enxame que encontrares preso à ponta de um ramo. Dorme trezentos e sessenta graus de amor em vez de borboletar asas onde não tens queda para o voo. Alma-me a torto e a direito como uma manada de búfalos correndo desenfreada. Poema-me segredo ao ouvido num movimento leve de vai e vento. Chove-me com saliva enquanto a poeira não assenta e eu escrevo. Pesa-me tanto o sono dos teus olhos. Dá-me um grito para me calar. Dor-me. Não me doas o optimismo que dou ao mundo mesmo sabendo que o abismo cabe no intervalo entre duas vírgulas. Alegria-me com lágrimas de estimação inventa outra alegoria com barquinhos de ver passar. Luz-me clarão aceso pintado cor de areia. Rio-me com mar nos lábios para pôr as ondas no gerúndio. Caminha-me descalça com as mãos presas à vida onde sou ida e volta de uma viagem inadiável. Melodia-me com voz de vidro a partir mas antes de abateres a porta deixa dois ou três beijos para eu ir beijando monolabialmente.
És a sanzala. És o chão. És pulseira. És missanga. És brinco com versos pendurados. Brinco descaradamente sobretudo quando palavras não querem ser poesia. Brinco preguiça de poema com cara de quem acordou dum sono em que não dormiu ou brincou. Brinco. Mas nunca o mau gosto de trincarmos dias que passam sem deixar rosto no corpo. Só porque és o chão. És o caminho. Escrita. Escama. Esmola. Estudo para mim. Porém. Livra-me do livro dos teus queiciumes. Tu. És tudo. Sobretudo. Esperança.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Prosaria
À hora da poesia. Apago com luz estrelas que aguardam que o sol friolentamente se dilua no céu e faça luar o teu nome. Apago com palavras aquelas noites em que o sono não pega em ti e adormecemos de abraços dados cada um com o seu lugar marcado. À hora da poesia. Não faças distância perto de mim. Já não temos juízo nem idade para mastigar saudades.
À hora da poesia.
És tu o poema. Por isso engole estes versos que te dou sob a forma de tranquilizante para curar a arritmia dos dias feitos de sonhar. Negra-me na pele uma cicatrizte estampada com um arco e um íris. Endireita o caminho enquanto atraverso o poema de um lado ao outro e dá-me tempo para temperar a impaciência.
À hora da poesia.
Farei silêncio grelhado com pedaços de lua cheia. Farei carícias enlatadas e cachos de manga com sabor a fruta. Se restar fôlego. Farei crepúsculo cozido com fragmentos de nevoeiro. Oh. Não. Tudo menos crepúsculo. A última vez que fiz deixei queimar as horas dentro da panela. Quando destapei o tempo já não havia minutos que chegassem para namorar prazeres.

À hora da poesia.
É o teu alguém que acontece em mim como se não tivesse acontecido nada. É o idoso que vou sendo cada vez que a idade celebra mais um ano. É despertar com os teus sorrisos os sorrisos que ainda não ousas. São antídotos fora do alcance da fala. São botões de emergência preguiçosos. São braços entrelançados no peito.
À hora da poesia.
Escrever-te-ei em prosa para que possas tomar cada verso como um banho de cascata no coração. Respirar profundo o mar de hoje rente à linha do horizontem. Descascar a loucura ao ritmo de um grito definitivo e descalçar ilusões antes que seja tarde para recuperar a realidade.
À hora da poesia.
Quem te mandou a ti ensaboar o corpo com insultos de amor? Quem te rasgou poemas nos olhos apenas pelo simples facto de serem cascas de relâmpago colados à pele? À hora de bater asas na cara de outros voos. Quem te mandou assaltar trapézios com a altura de um céu? Quem me virá acudir se me acontecer um poema e tu não tiveres mais poesia para encher versos? Quem sacudiu lençóis de água à varanda da minha sede? Quem te vai emprestar os meus lábios quando os teus já não tiverem mais beijos para gastar?
Eu. Eu que te julgava um poema? Não! Tudo menos poemas. Hoje sei que à vista desarmada a poesia é realidade que acontece quando não se tem outra ilusão. Mas. O que importa escrever assim ou assado se conservo em mim a dádiva de ser alado como um pássaro voando na direcção correcta?

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Obrigado mana Loide por me emprestares a tua máquina!

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

sábado, 2 de janeiro de 2010

Insolitário
Quando estiver quase a adormecer passem-lhe o sono pela torneira da água fria. Desatem o nó aos soluços que atravessam a garganta. Façam-no sentar à esquerda dos versos que mais não são que duetos com outras solidões. Risquem a pele os nervos a voz os pulsos com lâminas de encurtar distância. Quando estiver quase a amar. Não lhe ensinem amor como fazer de conta que se desfaz em conto de fadas.
Atirem-lhe contra a cara um balde cheio de poemas e mostrem-lhe com quantos beijos se faz a despedida. Tentem bebedeiras de palavras à toa e mostrem-lhe com quantos copos se enche uma noite vazia. Quando estiver quase a escrever. Interrompam-lhe as mãos várias vezes para que não remende as varizes do tempo. Não o deixem cozinhar o amor. Há de comer assim mesmo. Palavra a palavra. Até ficar cru.
Quando estiver quase a chegar. Destrancem fios de água doce em aquários doutros pássaros. Anestesiem-no com beijos que sobejam dos próprios lábios. Tirem a mania de reduzir nuvens a cinzas e esbofetear borboletas com candura suave de rapina. Atirem-no ao acaso com a força dócil das ondas e mergulhem este sonho feliz que se senta no colo dos versos como se um minuto fosse o instante lento que se senta segundos antes do despertar de quem não tem ainda o que sentir.
Oxalá a lua não o ponha a dormir até perder o sono das vistas. Oxalá o coração aguente mais um solavanco e espere tranquieto antes de mandar lixar os vários destinos que o destino é. Quando a voz lhe envelhecer nas palavras. Puxem-lhe os passos na direcção contrária do olhar. Lancem-no sozinho contra a cama e retirem as portas do casulo para quando entrar bater com o nariz no perfume das flores que não plantou. Quando estiver quase a descobrir. Destapem-lhe o futuro da frente e coloquem lá outra coisa que não seja passado. Leiam os gestos os dedos as mãos os braços a carne e gastem-lhe os caminhos de tanto andar a pé.
Quando cair num sonho feliz. Respirem-lhe os versos devacarinho para não doer. Deixem-no escapar tranquilo e quieto nem que seja por um triz ou por um triste corpo devoluto.
Lembrem-lhe que com as palavras não se brinca. A menos que seja para dizer coisas sérias.