segunda-feira, 24 de maio de 2010

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Desaparências
Das noites em que meço a respiração dos pulsos com o lado mais macio dos teus cansaços. Das tardes em que bebo granizo pela boca da chuva e oiço a voz entornar-se gota a gota no chão descalço dos passos andados. É só disto que sei dizer. Mesmo quando quero expoesiar-me dos meus próprios gritos e romper palavras sem mais nem menos. Ir à toa com asas de quem fica. Ir sem caminho e apanhar-me de surpresa antes de ser engolido pelo teu abraço. Descalçar girassóis pétala a pétala até se transformarem em giraluas. Descascar versos gomo a gomo como se fossem sabor de laranja. Ir a sós com beijos insaborosos mostrar que nós também sabemos sorrir. À noitinha. Quando a dor meço com o lado macio dos cansaços.
É disto que sei dizer!
Quando a mansidão se impõe como um ruído sísmico. Só assim consigo escrever. Descascado e sentimentoso. Eis porque me lambuzo com bocadinhos de fome e vou embora de ti para voltar nunca mais ou no penúltimo verso depois do amanhecer. Eis porque apanho balanço para relampagar o céu e faço rascunho antes de pôr sentimento no coração e semeio pétalas onde só existes um pouco só.
Por isso.
Apago. Risco. Volto a dançar com palavras. Arrisco de novo. Assobio cítaras. Enfio sonhos uns atrás dos outros. Desenho um mapa na palma da mão. Desafio-te a usar silêncio para ser poeta ainda que disto não saia nada que sirva para enxugar aquela voz entornada no papel. Desafio-te a pintar os lábios com a cor dos meus beijos. A colocar legendas nos gestos que me queres dizer ou transmentir. A respirar o fôlego de cada frase como se isto fosse de prosa e não um poema.
Desafio-te!
Desafio-te a encontrar de novo um novo caminho que te encontre. Caso contrário. Que farei com a poesia se de tanto te dizer adeus as mãos acabarem aqui? Que farei?! Que farei com este corpo que me resta se não regressares (pelo menos) para te dizer cara a cara que afinal não sou alérgico ao silêncio? Que farei de mim se depois da bonança não sobrar sequer vestígio de alma para te acalmar?
Agora. Pergunta-me como te chamo!
Faz de conta que és metade de ausência e farei de ti meu sono preso por um fio de insónia. Pergunta-me como te chamas. Chamar-te-ei prosa poesíssima! Chão em que me deito. Devagaroso. Entre verdades e fantasiação.
Porque é disto que sei escrever!
É isto que me desaparece da frente quando invento lagrimações só para tornar a solidão mais convincente. É isto que me aparece como se alguma vez tivesse escrito sem sinais de pontuação.
É disto que sei escrever!
Desaparências. Coisas que varrem nos poemas o que neles não deve iludir.

segunda-feira, 3 de maio de 2010