360 graus de Amor
Não quero poesia nos meus poemas sobretudo aquela cuja pele é farrapo e cansaço e gume e pulso e âncora inútil ilusão. Talvez poesia seja só pretexto para arrastarmos as palavras connosco. Sim. Arrastar palavras pelo braço de uma frase e de repente apagar a frase e o braço e largar fonemas a pique de encontro ao coração metáfora. Talvez. Talvez não queira palavra nos meus poemas só por haver silêncios que nos quebram a fala. Talvez não queira poema na minha poesia só porque tenho coisas imaginadas em horas de não ter mais nada que fazer.
Poema não quer ser poesia quando te sentas à porta das palavras à espera que entre um verso e outro verso entrem pela janela frases perfumosas que não saem nem amar-te lada. Talvez o amor não queira ser diminutivo tão rapidinho tão ilusãozinho tão pouquinho até no tamanho. Talvez isto seja só a minha âncora farrapo palha falhaçada inútil amassar de pão que como em dias tão nossos como ninguém.
As árvores e as aves as sombras e o ombro que te encosto à cabeça. São protestos de te dizer em voz doce: Colmeia-me o silêncio pólen de poesia. Pedra-me sete pétalas na mão e atira-me o primeiro enxame que encontrares preso à ponta de um ramo. Dorme trezentos e sessenta graus de amor em vez de borboletar asas onde não tens queda para o voo. Alma-me a torto e a direito como uma manada de búfalos correndo desenfreada. Poema-me segredo ao ouvido num movimento leve de vai e vento. Chove-me com saliva enquanto a poeira não assenta e eu escrevo. Pesa-me tanto o sono dos teus olhos. Dá-me um grito para me calar. Dor-me. Não me doas o optimismo que dou ao mundo mesmo sabendo que o abismo cabe no intervalo entre duas vírgulas. Alegria-me com lágrimas de estimação inventa outra alegoria com barquinhos de ver passar. Luz-me clarão aceso pintado cor de areia. Rio-me com mar nos lábios para pôr as ondas no gerúndio. Caminha-me descalça com as mãos presas à vida onde sou ida e volta de uma viagem inadiável. Melodia-me com voz de vidro a partir mas antes de abateres a porta deixa dois ou três beijos para eu ir beijando monolabialmente.
És a sanzala. És o chão. És pulseira. És missanga. És brinco com versos pendurados. Brinco descaradamente sobretudo quando palavras não querem ser poesia. Brinco preguiça de poema com cara de quem acordou dum sono em que não dormiu ou brincou. Brinco. Mas nunca o mau gosto de trincarmos dias que passam sem deixar rosto no corpo. Só porque és o chão. És o caminho. Escrita. Escama. Esmola. Estudo para mim. Porém. Livra-me do livro dos teus queiciumes. Tu. És tudo. Sobretudo. Esperança.
33 comentários:
há muito tempo,
um poema magoou-me...
...rasguei-o com as mãos,
e hoje sofro saudade.
em silêncio.
porque as
palavras
já de nada
valem...
Caracaaa...tu sabes jogar muito bem com as palavras...muito mesmo!
Vim te agradecer a visita e pedir que voltes sempre...estou a seguir teus rastros.
beijos_______________Felina.
Prodigioso e Escritor Sublime Amigo:
"...Não quero poesia nos meus poemas sobretudo aquela cuja pele é farrapo e cansaço e gume e pulso e âncora inútil ilusão. Talvez poesia seja só pretexto para arrastarmos as palavras connosco. Sim. Arrastar palavras pelo braço de uma frase e de repente apagar a frase e o braço e largar fonemas a pique de encontro ao coração metáfora. Talvez. Talvez não queira palavra nos meus poemas só por haver silêncios que nos quebram a fala. Talvez não queira poema na minha poesia só porque tenho coisas imaginadas em horas de não ter mais nada que fazer..."
Que "coisa" mais linda e sublime de talento.
Divinal e perfeita.
Trata as palavras de forma fantástica. Parecem que saiem como por magia.
Excelente e notável, amigo extraordinário!
MUITO OBRIGADO pelas suas palavras amáveis deixadas expressas no meu blogue que adorei.
Abraço de respeito e estima enormes.
Com admiração constante
pena
Fabuloso!
Bem-Haja, pela sua amizade que é recíproca, divinal Amigo GIGANTE.
Parabéns.
Amigo!
Ainda existe esperança?
Ah! então está tudo bem.
Belo texto.
Um beijo.
Inenarrável!
Vem mais pra perto... Com você o reino das palavras parece o paraíso... Não tem hífens mal colocados; não tem agudos que machucam... Com você, a vírgula acalma, o ponto enfeita... a língua se renova sempre!
Amo-te, amigo!
Beijos de fascínio longo!
A palavra que aproxima as pessoas é a que eu mais gosto.
Um grande abraço,
José.
Se contudo permite ainda a esperança, já me alegro.
Tomar das palavras e usá-las dessa forma, é pra poucos e bons.
Parabéns!
Abraço com carinho.
OLá...obrigado pela presença lá no Verseiro...
Tem um estilo todo próprio de brincar a a sério com as palavras...
Um abraço na alma...
n sei nem comentar, simplesmente, vc é demais.
bjosss...
... céus!...
Cada palavra sua é um poema, cada frase leva-nos ás alturas da imaginação de todos os blogues que sigo aqui é onde eu perco mais tempo a saborear a sua ímpar maneira de conseguir dar vida ás palavras!
Invejo-o não consigo evitar!
Um abraço
Belissima construçao em palavras de amor,,,,conseguiu expressar bem todos os sentimentos guardados,,,,abraços amigo e um belo dia pra ti.
Muito interessante seus pensamentos e o uso criativo que faz com as palavras...e a gente sempre acaba falando da vida e dai falamos de amor.
Obrigada pela visita.
beijos
Um líquido doce de palavras e silêncio, é isso a tua poesia. Um caminho. Uma esperança.Uma estética. Avida!
Abraço amigo, sempre:))
Li uma vez que a poesia é a arte de levar as palavras a passear e é isso que fazes. Podia escrever algo todos os dias e nunca tocar ninguém com as minhas palavras. Mais importante que ser constante é ser enleante. Baptista-Bastos disse entre ouras coisas que escrever não pode ser uma carreira. Carreira é coisa de eléctricos, de autocarros. Escrever é chegar com as palavras muito além do que imaginamos sequer, é dar-lhes asas e a dignidade que elas merecem. As palavras aqui têm asas e voam.
adorei, mano, sobretudo a 'ultima estrofe!
tem a tua garra/cunho original, a chama africana, o sangue 'unico que fervilha com tudo e com todos porque se envolve (e revolve) com o mundo que se acerca, que 'e dor, e amor.
360 graus de amor pela sua inevitabilidade, creio eu...
bj grnd luz paz
Gostei muito da criatividade na composição e no ritmo, da pertinência dos neologismos e da intensidade crescente do esboço emotivo!
Abraço
não há um dos teus textos que não me emocione de formas inusitadas, e que não deixe atrás de si a trilha dos tudos e quases que evoca mesmo na "recusa" em ser poesia.
bem no cantinho de minhas palavras, faltam adjetivos quando passeio por aqui :)
um grande beijo
Que bonito! Afinal, há sempre alguém que nos é tudo! *
Olá
Usar as palavras com ritmo e criatividade é uma arte e por aqui há arte!
Bjs
Um texto interessante
com algum gosto a "dépaysement".
Forte abraço
Excelente prosa poética, excelente conceito de Poesia!
:)
bj
Estive por aqui. Beijos.
Edu, querido!
Hoje parei no topo de sua pagina... "As palavras são a varinha mágica dos ilusionistas que recriam a vida e nos deixam sem perceber onde acabou a ilusão e onde a realidade nunca existiu" Que coisa mais linda! Profunda! magnifica! Voce tem uma intuicao nas palavras que eh realmente incrivel.
Li esse texto seu maravilhosoooooo (e o anterior) e virei comenta-lo.
Aguarde.
Beijos querido, e saiba que eu o tenho em meu coracao. Sempre!
Mary
Não tenho palavras para comentar o "poema"
não é costume. mas pronto. não tenho. o que queres Dudu?
olha:
"Talvez não queira palavra nos meus poemas só por haver silêncios que nos quebram a fala."
o resto dir-te-ei pessoalmente.
Nómada
Um belo concerto de palavras
em riste
Força
Um texto e tanto; vibrei com a força das palavras.
numa fabulosa linguagem poética, a urgência de uma poesia pura e, principalmente, de amor puro, genuíno, que deixe rasto, como diz o texto.
abraço.
Gostei do blog.
Sinto nos teus poémas uma grande africanalidade que so os verdadeiros africanos conseguem-no descrever e transmitir.
Tem autenticidade e legitimidade social.
Parabéns.Mais uma vez.
sérgio conceição
Belo jogo de palavras, onde a poesia está em cada uma delas!...
Assim é que se deve amar.
Maria
"Mas nunca o mau gosto de trincarmos dias que passam sem deixar rosto no corpo(...)"
O ser humano está sempre sob uma fronteira, olhando o interior de si, ele olha nos olhos do outro.
Vejo meus olhos nos seus.
"Talvez poesia seja só pretexto para arrastarmos as palavras connosco."
Gostei disto, como aliás gostei do que se segue.
Ali tudo faz sentido para quem lê sentindo.
Bom fim de semana
Maria
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